Em 7 anos juntos, eu e o senhor namorado (agora que temos um filho sinto-me ridícula em chamar-lhe assim, mas adiante) nunca tínhamos passado o Natal juntos, para não deixar nenhuma das nossas famílias triste (e porque o Natal é tradição, e cada um de nós tinha as suas e nunca nos fez confusão passar a quadra separados). Mas sempre dissemos que quando tivéssemos um filho a coisa mudaria de figura. E assim foi. Conversámos e ele cedeu a que o nosso primeiro Natal juntos fosse passado na Madeira, com a minha família.
Foi em maio, grávida de 5 meses - quando já tinha passado a fase mais vulnerável da gravidez - que decidi comprar as viagens de avião. Os preços já estavam caríssimos (nada que me admirasse) e para não pagar um absurdo eu teria que ir no dia 16, sendo que essa data não era viável para o senhor namorado por motivos profissionais. Na altura um pouco às cegas, decidi arriscar e comprar viagem para ir sozinha com o Gu, no dia 16, e o senhor namorado logo se juntaria a nós uma semana mais tarde. Não seria a primeira pessoa a viajar sozinha com um bebé, haveria de conseguir.
Depois do Gu nascer, e com toda a logística associada a saídas com ele (desmontar carrinho, carregar o ovo, carregar as mil tralhas da cria e as minhas) tornou-se mais real a noção de que seria, efetivamente, uma aventura viajar sozinha com o Gustavo. Até que o meu querido pai - sem eu pedir nada - decidiu comprar uma passagem para vir a Lisboa buscar-nos, à filha e ao neto. Se isto não é o melhor avô do mundo, não sei o que será...
O dia 16 chegou. O tempo não estava famoso nem em Lisboa nem na Madeira. Na Madeira havia mesmo alerta amarelo e durante a manhã vários aviões foram desviados, sem conseguir aterrar. Se eu já estava nervosa por ir viajar com o meu filho de 3 meses, este cenário não ajudou nem um pouco.
Saímos de casa ao final da tarde, debaixo de chuva e trânsito. Mr. Gu fez o maior berreiro da (curta) vida dele no carro (ele até gosta de andar de carro na maior parte das vezes, mas lá está, tem que estar mesmo a andar...trânsito e pára arranca não é bem a cena de sua excelência. como o percebo...). Chegámos a aeroporto e o Gustavo acalmou logo. Custou-me tanto despedir do senhor namorado (e ele do filho...). Descobri um cantinho simpático e discreto onde dei maminha, e lá fomos para o avião. Se o meu pai não estivesse comigo, eu não teria tido alternativa que não pedir ajuda a um estranho para pegar no meu filho enquanto desmontava o carrinho do Gu para entregá-lo ao pé do avião (e carregar a tralha toda teria sido efetivamente um filme). Eu continuava sob um camadão de nervos. Já o Gustavo estava tranquilo, a apreciar tudo com muita curiosidade (dormir é que...nada). Entrámos no avião e fomos brindados com aquilo que já é muito habitual no aeroporto de Lisboa - uma eternidade dentro do avião à espera de podermos levantar voo. Mr. Gu sempre calmo. Quando descolámos dormiu perto de meia hora (e foi tudo o que dormiu entre as 16h e as 22h). Depois disso mamou e esteve calminho. Teve uma colicazinha mas nada de mais. Ao aproximarmo-nos da pista de aterragem na Madeira, respirei fundo, agarrei-me ao meu pai, e a aterragem foi bem mais pacífica do que eu esperava para um dia de alerta amarelo. Mas todo o sofrimento por antecipação que passei ninguém mo tira. Respirei, finalmente de alívio, agradeci muito o comportamento do meu filhote (que não poderia ter sido melhor), e lá fomos para casa.
No dia seguinte vivi o momento alto da viagem: apresentei o Gustavo aos meus avós paternos (os únicos que ainda tenho vivos). Há uns anos, em conversa (sem estar doente nem nada), a minha querida avó comentou, de lágrimas nos olhos, que já não iria a tempo de conhecer os bisnetos. Mostrar-lhe que estava errada - ainda que ela já não tenha a lucidez dessa altura - foi um momento mesmo especial. Ainda por cima o meu filhote fartou-se de rir para os meus avós. Coisa boa.
Outro momento especial foi a chegada do senhor namorado. Estar sem ele durante uma semana foi duro - para ele e para mim (só nós é que adormecemos a cria...e oh, se ela é difícil de adormecer durante o dia!).
Foi mesmo bom ver a alegria de toda a família com a chegada do Gustavo, o quão ele espalhava sorrisos a toda a hora por todos. Foi, sem dúvida, um Natal especial.
No dia do nosso regresso - dia 26, a minha mãe ficou com o Gu e eu e o senhor namorado fomos tomar o pequeno almoço fora. Quando cheguei a casa e vi que a minha mãe tinha conseguido adormecê-lo fiquei admirada e mesmo feliz.
A despedida foi dura. Há muito, muito tempo que uma viagem de regresso a Lisboa não me custava tanto. E nem foi por mim, mas sim por saber o que custa, principalmente aos meus pais, estar longe do Gustavo, e o quanto eles foram felizes enquanto nós lá estivemos. A chegada dos filhos muda-nos mesmo a perspetiva da vida....bem, muda-nos a vida toda, na verdade.
A viagem de regresso não foi tão pacífica como a ida. Contrariamente ao que eu esperava, também esperámos algum tempo para descolar, mas desta vez o Gustavo não teve paciência, e desatou a chorar, inconsolável. Eu tinha-o preso de costas viradas para mim, no cinto dele, e achava que não conseguia/podia amamentá-lo. Mas em desespero, depois de uns 10 minutos, virei-o para mim e lá o consegui acalmar (felizmente não há praticamente nada que a mama não resolva). Foi engraçado que, sendo já a segunda viagem com ele (e estando bom tempo), mesmo perante este cenário eu consegui manter a calma. Ao contrário do senhor namorado, que costuma ser o mais calmo de nós dois (mas que se estava a estrear naquelas andanças de viajar de avião com o Gu). E, contra o que eu imaginei, fui eu a acalmá-lo. A partir daquele momento a viagem correu sem mais percalços. E lá chegámos a Lisboa, ao final da noite.
Não me arrependi por momento algum da decisão que tomámos de ir à Madeira com o Gustavo tão pequeno, mas sendo muito honesta. foi difícil. Em termos físicos - por toda a logística associada, e eu até tenho a sorte de amamentar - e em termos psicológicos, de todo o receio de que alguma coisa corra mal. Quando estávamos em pleno voo, o senhor namorado perguntou-me, em tom irónico, "Então, ainda tens vontade de levá-lo de avião a conhecer o mundo?". E sorri e disse-lhe que aquele não era, de todo, o momento para tomarmos esse tipo de decisão (li algures que não se devem tomar decisões com base em emoções temporárias - algo do género - e faz-me todo o sentido). Indiscutivelmente, não é fácil (pelo menos para nós), mas não desisti, de todo, da ideia de voltar a andar de avião com o Gustavo nos próximos tempos (aliás, pelo menos à Madeira iremos no verão. E ainda bem que comprámos as passagens antes da viagem do Natal, não fosse o senhor namorado ter mudado de ideias entretanto ;)). E ter tido um Natal tão especial, em que consegui juntar o meu filho e os meus avós, valeu todo o esforço.